Caminho da Luz renova parceria com a Prefeitura e amplia atendimentos
Seca
Fantasma de 89 assusta os bageenses

Samuel da Rosa/Especial FS - Níveis das barragens expõem a dura realidade
A seca de 1989 está encravada na memória dos bageenses. Mesmo quem não era nascido nessa época, conhece o drama de quem viveu a falta de água. Imensas filas se formavam por baldes de água que eram entregues pelos caminhões-pipa. O solo da Rainha da Fronteira torrava, campos e cidade foram castigados de forma impiedosa pela falta de chuva. Os relatos da época são aterradores - o ano letivo teve o início retardado, as piscinas foram transformadas em reservatórios e o comércio e repartições públicas reduziram o horário de funcionamento.
Não saia uma gota de água das torneiras e as pessoas precisavam ir em diversos locais para pegar água. No pátio do Departamento de Água, Esgoto e Arroios se formavam filas enormes porque ali tinha um poço artesiano e as pessoas saiam carregando baldes cheios. O mesmo acontecia no Calçadão, onde também havia um poço artesiano. As pessoas corriam desesperadas atrás de água. As pedreiras localizadas na zona Leste da cidade foram acionadas para abastecer a população.
Passados 34 anos, a situação da falta de água não mudou e mais uma vez a Rainha da Fronteira é castigada pela forte estiagem, o que faz com que novamente a população tenha que enfrentar um racionamento, que hoje é de 12 horas - e a Prefeitura já avisou que a partir da próxima terça-feira passará a ser de 15 horas e que novamente as pedreiras serão acionadas para abastecer oito bairros da zona Leste.
A nova barragem, que deve solucionar o problema, está em fase de construção.
Briga por uma gota de água
A reportagem conversou com quem viveu essa dura realidade e agora enfrenta um novo racionamento - de acordo com a direção do Departamento de Arroios, Água e Esgotos de Bagé (Daeb), os reservatórios têm água para apenas 40 dias.
A funcionária pública municipal Elida Hernandes Garcia, 77 anos, relatou que aquela situação foi muito terrível. Ela teve que mandar as duas filhas para a cidade de Rio Pardo, porque em Bagé não havia água. Elida lembrou que, duas vezes por semana, um caminhão-pipa da Prefeitura estacionava na frente da escola municipal General Mallet e ali se formavam filas. “As pessoas não tinham paciência e muitas vezes entravam em vias de fato pela disputa pela água. Eu e o meu esposo juntamos tudo que era recipiente e, para conseguirmos tomar banho, meu esposo adaptou um balde de plástico. Ele fez vários furos e colocava água ali e, assim, tomávamos o nosso banho”, recordou.
Elida disse que, no local conhecido como Paredão, apareceu uma vertente e as pessoas iam ali pegar água. “Inclusive, apelidamos o local como salvador da pátria, mas a água dali acabou rápido”, lembrou.
O aposentado José Adilson Dutra, de 60 anos, comentou que, naquele tempo, ele morava na rua Gomes Carneiro, e que, no campo de futebol do São Sebastião, havia um poço artesiano. “Nós, os moradores da região e outras pessoa,s pegávamos água dali. Carreguei muita água”, relembrou o aposentado.
O advogado José Álvaro Correa dos Santos, 65 anos, conhecido como Chacrinha, disse que, na época, eram poucas as pessoas que tinham caixa de água e, com a seca, os bageenses armazenavam água em bacias, baldes e economizava o máximo possível.
Chacrinha relatou que piscinas do clube Caixeiral foram transformadas em reservatórios para distribuir para a população. “O pessoal tratava a água que, depois, era distribuída e muitas pessoas tomavam banho porque não tinha água nas torneiras”, sublinhou.
Água mineral no bebê
O professor Domingos Felipe do Pró, 64 anos, morava na rua Barão do Itaqui no bairro Getúlio Vargas. Ele contou que, duas vezes por semana, a Prefeitura colocava na esquina da Rodoviária um container com água que era imprópria para o consumo - dava apenas para fazer limpeza e usar no banheiro. Depois, o Sesi perfurou um poço, onde também era feita a distribuição de água. “Me lembro muito bem daquela situação”, lamentou.
Do Pró disse que bem no auge da seca nasceu a sua filha mais velha, e que, para poder dar banho na criança, a família comprava água mineral.
Banho de canequinha
O funcionário público municipal Ricardo Sávio Pimenta de Araújo, 61 anos, morava na Cohab e tinha filho pequeno. Segundo ele, na avenida Marechal Floriano, em direção a Cohab, antes da ponte, havia uma vertente e era dali que as pessoas pegavam água. “As filas eram imensas porque, quando a água vinha, às vezes, durante a madrugada, a gente tinha que juntar e, quando tinha água nas torneiras, aproveitávamos e tomávamos banho. Nos outros dias, o nosso banho era de caneca”, detalhou.
O radialista Rogério Lima Vignol, 54 anos, lembrou que a família buscava água na casa de um amigo que tinha poço. “Era uma água salobra. Nem todo mundo tinha caixa de água. Aquilo foi horrível. Os colégios não funcionavam e nem sempre a gente tomava banho de chuveiro. Era apenas de canequinha”, recordou.
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