Na maioria das vezes, as pessoas não atinam a detalhes que são fundamentais na vida da humanidade, bem como na sua existência sobre a terra e como um todo. Baseado nisso e, a título de ilustração, quero chamar atenção para um fato que na realidade é um conjunto deles.
O homem, observado ao longo da seu amadurecimento na face da terra e entendido à luz da mesma evolução ocorrida em outros animais, observando-o, ainda, sob o aspecto crucial da sua sobrevivência como raça - sendo ele tão frágil - apresenta circunstâncias intrigantes. Uma delas é como o homem sobreviveu diante de outros seres maiores e bem mais fortes que ele, a disputarem o mesmo espaço? É claro, a inteligência e o conseqüente uso de ferramentas e, depois de armas, são a maior explicação e a mais provável. Acontece que a inteligência para chegar a este ponto e a tais invenções só atingiu este ponto muitos milênios depois de o homem andar escondido em cavernas, andando quase de quatro e sem se comunicar oralmente com os semelhantes, pelo simples fato de que ainda nem havia atingido a maturação da palavra.
Se não foi, então, por razões comuns e as mais imediatas no nosso raciocínio, é necessário que sejam buscadas outras causas, iguais que em outros seres vivos superiores; e lá encontraremos o medo. Sim, o medo. Diz um velho ditado, que o medo dá muito bons conselhos...ou deveria. Pois, essa sabedoria, talvez, seja uma herança incrustada no nosso inconsciente coletivo e que transmitiu a sua importância desde os primórdios. Foi o medo que, ao fazer os outros animais esquivarem-se de seus predadores – como o coelho à raposa - que, igualmente no homem, o fez evitar confrontos, evitando trilhas perigosas, reconhecendo seus inimigos, ter cautela com o desconhecido, tudo enfim, que pusesse em risco a vida de cada um da raça e a sobrevivência dela como um todo. E a outra função cerebral de igual importância, principalmente em eras mais recentes, foi a memória, sem a qual o homem jamais teria sobrevivido.
A memória divide-se em sub-funções diversas; existe no homem uma memória que ocupa tão somente a camada mais superficial do cérebro, do nosso raciocínio de uso diário, e não chega a ser armazenada, mais do que por um tempo efêmero – é a chamada memória de trabalho. Exemplificando, é a memória que usamos para procurar um número de telefone na lista e o guardamos o suficiente para discá-lo e depois o esquecemos. Existe uma outra memória, um pouco mais elaborada, a qual se vale de camadas mais profundas da córtex cerebral para ser guardada e que armazena um conjunto bem maior de fatos ou estímulos. É a memória recente sobre os últimos acontecimentos e que, dependendo da quantidade de estímulos – e do efeito de repetição – com que foi mandada aos locais de armazenagem, fica retida mais ou menos tempo. Destas, algumas serão esquecidas, outras com o tempo passarão para a memória remota. A memória remota é a memória evocativa, aquela de coisas antigas que, com facilidade os mais idosos – por terem menos memória recente - trazem-na ao exercício com facilidade.
Um fator fundamental na qualidade de nossas memórias é a qualidade das emoções, mas sobretudo a quantidade delas, quando acompanham um fato a ser memorizado. Por exemplo, o primeiro beijo ou a primeira namorada; ou então, o que passou na noite de um vendaval ou de um assalto. Um outro fator importante na função da memória, é o fato ou os fatos que fazem acompanhamento a um fato principal em vias de ser memorizado, motivo pelo qual, comumente, um rosto ou outra memória qualquer, desencadeiam um rol de outras lembranças.
Então, o homem ao sobreviver aos tempos e suas ameaças, por ter um dia sentido medo e, por conservar a memória de fatos ameaçadores, evitou, por exemplo, passar por um lugar onde os riscos de vida estiveram maiores. E assim, sobreviveu aos tempos.